Falar de morte já é penoso; quando a perda envolve um bebê ainda no útero, a dor costuma ser abafada por um silêncio social que agrava o sofrimento.
A apresentadora Tati Machado, que revelou recentemente ter perdido seu filho no oitavo mês de gravidez, trouxe o tema de volta aos holofotes e levantou uma questão fundamental: como cuidar da saúde emocional de quem vive esse abalo?
A dor que precisa ser reconhecida
A psicanalista Andrea Ladislau lembra que ainda há quem tente minimizar a angústia com frases como “você é jovem, pode engravidar de novo”. “Não, não está tudo bem”, reforça ela.
O luto é legítimo, precisa de acolhimento e espaço para que a mulher possa chorar, sentir raiva, frustração ou qualquer outro sentimento que apareça.
O objetivo não é “superar”, e sim elaborar cada emoção para evitar que a tristeza evolua para um quadro depressivo.
Cada tempo é um tempo
O corpo e a mente sentem a perda de maneira intensa, e comparações (“eu já estaria melhor”) só geram culpa. “O luto não tem relógio”, diz Andrea. Existe o Chronos, o tempo cronológico dos dias e horas, e o Kairós, esse tempo interior que dita quando a dor amolece.
Respeitar o próprio compasso e contar com uma rede de apoio que acolha, não julgue (é parte essencial da cura).
Por que dói tanto?
Do ponto de vista psicanalítico, a gravidez coloca a mulher num lugar singular: ela se relaciona com o bebê, mas também consigo mesma.
A morte intrauterina atravessa o narcisismo, o corpo e o papel simbólico da maternidade. Reconhecer a existência — ainda que breve — desse filho é passo decisivo para que a perda ganhe significado.
Quando não sabemos lidar com a morte
Nossa cultura costuma buscar a eliminação imediata da dor, mas luto não é enfermidade. Confundir tristeza com depressão leva ao equívoco de estipular um prazo para “voltar ao normal”. Elaborar a perda implica adentrar o desconforto, e não atropelá-lo.
Caminhos para o cuidado
- Acolhimento sem julgamentos: Evitar frases de incentivo vazias e oferecer escuta genuína.
- Rede de apoio verdadeira: Amigos, familiares e profissionais de saúde mental devem validar sentimentos e respeitar silêncios.
- Liberdade para ritualizar: Escrita de cartas, cerimônias simbólicas ou qualquer forma de despedida ajudam a concretizar a experiência.
- Atenção ao corpo: Alterações hormonais e físicas merecem acompanhamento médico e psicológico.
Ressignificar não é esquecer
Com suporte adequado, cada mulher — famosa ou anônima — consegue gradualmente atribuir outro sentido à perda, elaborando culpa, saudade e tristeza profunda. Mais importante, percebe que não está sozinha. O luto gestacional é real, profundo e merece ser tratado com respeito, sensibilidade e amor.