Esses 4 doramas combinam humor, afeto e crítica social com roteiros afiadíssimos
Histórias que divertem e emocionam ao mesmo tempo em que dissecam, com inteligência, temas como classe, trabalho, gênero e família

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Alguns doramas conseguem o equilíbrio raro entre provocar risos, aquecer o coração e, ao mesmo tempo, oferecer comentários sociais afiados. São histórias que, sob a superfície de comédias românticas ou dramas leves, escondem um olhar crítico e atento às tensões do mundo real: desigualdade social, precarização do trabalho, expectativas familiares sufocantes, relações de gênero e solidão urbana.
O mérito dessas obras está justamente em não tratar seus temas com didatismo ou pesar. A crítica social surge integrada à narrativa, diluída em diálogos inteligentes, situações absurdamente críveis e personagens que, mesmo nos momentos mais cômicos, mantêm profundidade emocional. O humor, aqui, não serve como fuga da realidade — e sim como lente de aumento, como respiro, como denúncia elegante.
Selecionamos quatro doramas que exemplificam esse equilíbrio. São roteiros que abraçam a ternura e a leveza, mas jamais abrem mão de provocar o espectador — seja com risadas amargas ou com afeto inquieto.
1. Misaeng: Incomplete Life
Baseado em um webtoon de grande sucesso, Misaeng acompanha Jang Geu-rae, um jovem sem diploma universitário que consegue um estágio em uma grande empresa graças à sua experiência com o jogo Go. O dorama retrata com precisão quase documental os bastidores do mercado de trabalho coreano — e o faz com um roteiro que oscila entre o cômico, o desesperador e o profundamente humano.
Geu-rae é tratado como um corpo estranho em um ambiente altamente competitivo, hierárquico e impessoal. O drama é temperado com diálogos afiados, chefes caricatos (mas reconhecíveis), e um humor ácido que desnuda os absurdos corporativos. Ao mesmo tempo, o roteiro encontra espaço para laços de solidariedade inesperados, pequenas vitórias emocionantes e uma crítica social clara sobre meritocracia e exclusão.
O equilíbrio entre crítica e ternura transforma Misaeng em uma das obras mais completas sobre o mundo do trabalho já produzidas pela televisão sul-coreana.
2. My Mister
Apesar do título que remete a uma comédia romântica, My Mister é um drama melancólico e delicado que surpreende pela honestidade com que trata o desgaste emocional provocado pela vida adulta. A história gira em torno de Park Dong-hoon, um engenheiro de meia-idade emocionalmente apagado, e Lee Ji-an, uma jovem endividada e emocionalmente exausta.
A crítica social é dura: exploração trabalhista, violência doméstica, pobreza extrema e a hipocrisia dos ambientes corporativos. Mas tudo isso é retratado com tamanha empatia que o resultado final emociona sem pesar. O humor é contido, mas aparece em diálogos secos, ironias de situação e interações familiares desconcertantes.
O roteiro brilha por sua sutileza — nunca força lágrimas, nunca dramatiza além da conta. A conexão entre os dois protagonistas, longe de qualquer romantização, é uma ode à importância de simplesmente estar ali para o outro, mesmo sem saber o que dizer. É um drama que entende que afeto também pode ser silêncio.
3. Fight for My Way
Fight for My Way acompanha quatro amigos de infância que tentam se manter fiéis aos seus sonhos enquanto enfrentam a frustração de empregos medíocres, relacionamentos instáveis e as pressões para “crescer” de acordo com os padrões da sociedade.
Ko Dong-man quer voltar a lutar profissionalmente, Choi Ae-ra sonha em ser apresentadora, mas trabalha como atendente em loja de departamentos. O dorama faz rir com diálogos rápidos e situações absurdas, mas logo escancara o quão exaustiva pode ser a vida quando a promessa do sucesso se transforma em uma cobrança cruel.
O roteiro é inteligente ao retratar as micro-humilhações da vida adulta e a solidão disfarçada de responsabilidade. A leveza dos relacionamentos entre os personagens serve como contraste ao mundo exterior, mas também como denúncia — é a intimidade e o apoio mútuo que impedem esses jovens de sucumbir.
Com humor e ternura, Fight for My Way se posiciona como um grito sutil contra uma sociedade que valoriza mais os títulos do que os afetos.
4. Be Melodramatic
Três amigas na casa dos trinta trabalham na indústria televisiva e tentam equilibrar vida profissional, traumas emocionais, luto e desejos contraditórios em Be Melodramatic. Com um estilo ousado, o dorama quebra a quarta parede, insere diálogos metalinguísticos e constrói cenas cômicas que beiram o surreal — sem nunca perder a veracidade emocional.
Im Jin-joo, roteirista excêntrica e espirituosa, serve como catalisadora de muitos dos debates do dorama: a tensão entre o que se vive e o que se escreve, o limite entre a autonomia feminina e a idealização romântica, o valor do fracasso. O humor é inesperado, o ritmo é não convencional, e os personagens secundários brilham com complexidade.
A crítica social aparece em cada camada: o machismo nos bastidores das produções, o peso do luto não reconhecido, a cobrança estética. Ainda assim, a série é quente, divertida e cheia de ternura — um retrato honesto e moderno da vida como ela é, com tudo de ridículo e sublime que carrega.