Octávio Santiago lança livro que discute preconceito contra o povo nordestino

Lançamento em Recife será na Fenearte; obra detalha história de estereótipos, apagamentos e desigualdade e propõe novo espelho para olhar o Nordeste

Publicado em 04/07/2025 às 22:23
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Como se constrói um estereótipo? Quando o Nordeste passou a ser retratado como sinônimo de atraso, miséria e ignorância? E por que essa imagem, injusta e imprecisa, persiste no imaginário brasileiro?

Essas são algumas das questões que movem Só sei que foi assim: A trama do preconceito contra o povo do Nordeste, de Octávio Santiago, lançamento da Autêntica Editora.

A obra, resultado de sua pesquisa de doutorado na Universidade do Minho, em Portugal, percorre o modo como, ao longo do último século, discursos políticos, culturais e midiáticos forjaram uma identidade subalterna para o povo nordestino.

Sem abrir mão do rigor analítico, Santiago oferece uma leitura envolvente e acessível, um livro que pode ser lido de ponta a ponta ou consultado em momentos de reflexão, como um guia necessário para compreender e desconstruir imagens cristalizadas no cotidiano.

“Se os primeiros quatro séculos da nossa história oferecem uma chave para entender os conflitos entre os Brasis, os últimos cem anos trazem uma constatação incômoda. Grande parte das declarações feitas sobre o Nordeste e sua população, logo após sua formalização no papel, permanece inalterada. Ao ponto de ainda ouvirmos as mesmas sentenças depreciativas de 1925, como se, em um país em constante transformação, a percepção de uma parte dele sobre os nordestinos fosse a única coisa que não tivesse evoluído”, afirma o autor.

A estrutura do livro remete à dramaturgia clássica, com cinco atos que abordam os pilares desse preconceito: mão de obra e desigualdades, racialização, monotematização (seca, fanatismo, violência), oposição e interesses, e estereótipos físicos e culturais.

Divulgação
Imagem do livro "Só sei que foi assim" - Divulgação

Por meio de linguagem clara e narrativa fluida, o autor articula eventos históricos, conceitos teóricos e exemplos concretos que atualizam o debate e o aproximam do leitor de hoje.

Entre os pontos de destaque, Santiago resgata a figura de Macabéa, personagem de A hora da estrela, de Clarice Lispector, como metáfora do apagamento da identidade nordestina, moldada de fora para dentro. O autor propõe o conceito de “Complexo de Macabéa”, em referência à postura submissa, invisível e culpada atribuída a essa população.

A obra também se debruça sobre representações recentes que demonstram como esses estigmas ainda operam.

O autor analisa, por exemplo, a recepção crítica à novela da TV Globo No rancho fundo, cuja caracterização dos personagens reacendeu debates sobre caricaturas nordestinas no audiovisual. E comenta o emblemático caso do “homem gabiru”, personagem de uma matéria da Folha de S. Paulo, de 1991, que comparava nordestinos pobres a uma “nova espécie humana”, desumanizando seus corpos e modos de vida.

Só sei que foi assim é uma leitura essencial para quem deseja compreender como o preconceito contra o povo nordestino se estrutura e se atualiza e o que é preciso fazer para desmontar essa narrativa. Ao propor um novo espelho para olhar o Brasil, o livro de Octávio Santiago se firma como obra de referência para educadores, estudantes, jornalistas e todos que desejam repensar o país e seus apagamentos.

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