Carnaval 2024

Alerta! Glitter, muito usado no Carnaval, prejudica o meio ambiente; entenda

O uso de glitter prejudica os organismos essenciais para os ecossistemas aquáticos, como as cianobactérias

Cadastrado por

Catêrine Costa

Publicado em 05/01/2024 às 12:37
Glitter - Reprodução/Freepik

As partículas de glitter, constantemente presentes em fantasias e maquiagens de Carnaval, podem prejudicar o desenvolvimento dos organismos essenciais para os ecossistemas aquáticos, como as cianobactérias.

Estas bactérias desempenham um papel vital nos ciclos biogeoquímicos da água e do solo, além de serem fonte de alimentação para outros seres vivos. Essa conclusão foi alcançada por um estudo realizado na Universidade de São Paulo (USP) e recentemente publicado na revista Aquatic Toxicology.

DANOS A NATUREZA

As partículas de brilho, também conhecidas como purpurina, são microplásticos com dimensões inferiores a 5 milímetros. Devido ao seu pequeno tamanho, não são capturadas pelos sistemas de tratamento de água, o que resulta em sua descarga direta durante o banho, escorrendo pelos ralos e se dispersando em praias, sedimentos, florestas, lagos e oceanos.

Estudos recentes indicam que, nos últimos anos, mais de 8 milhões de toneladas desse material foram despejadas nos oceanos, conforme a literatura científica atual.

O glitter, por não se decompor naturalmente, entra em contato com os organismos aquáticos e perturba o ecossistema ao seu redor. Essa interação pode ocorrer de várias maneiras, incluindo a ingestão, exposição a subprodutos tóxicos ou lesões causadas pelas bordas cortantes das partículas. Adicionalmente, suas características físicas, dimensões e propriedades dificultam a precisa avaliação dos níveis de contaminação da água.

ESTUDO

Em uma pesquisa realizada no Centro de Energia Nuclear na Agricultura da USP (Cena-USP), com apoio da Fapesp através dos projetos 16/14227-5 e 18/24049-2, cientistas investigaram os impactos de cinco diferentes concentrações de partículas de purpurina, que não são biodegradáveis, em duas linhagens de cianobactérias: Microcystis aeruginosa CENA508 (unicelular) e Nodularia spumigena CENA596 (filamentosa).

Essas linhagens são conhecidas por desencadear florações em corpos d’água e fazem parte de uma coleção de aproximadamente 800 linhagens coletadas no país pelo grupo Cyanos. Durante um período de 21 dias, a taxa de crescimento celular das cianobactérias foi monitorada a cada três dias por meio de espectrofotometria, que permite a medição da densidade óptica.

“Conseguimos observar que as doses crescentes de glitter aumentam o biovolume das células de cianobactérias, fazendo com que passem por processos de estresse que comprometem até mesmo a fotossíntese, o que destaca a toxicidade pouco explorada do glitter em microrganismos”, afirma Mauricio Junior Machado, autor do estudo e pesquisador do Laboratório de Biologia Celular e Molecular do Cena-USP em entrevsita a Veja. 

“Vale lembrar que, se algo afeta as cianobactérias diretamente, então indiretamente afetará outros organismos do mesmo ambiente", completa. 

Os resultados indicam que concentrações ambientais de glitter, semelhantes à maior quantidade testada (>200 miligramas por litro de água), podem ter impactos adversos sobre organismos sensíveis nos ecossistemas aquáticos. Especificamente, observou-se o efeito mais significativo em Microcystis aeruginosa, com alterações na taxa de crescimento ao longo do experimento: o pico de crescimento foi registrado no tratamento com 50 miligramas de glitter por litro de água, enquanto o menor crescimento ocorreu com 200 miligramas por litro de água.

Para Nodularia spumigena, o maior crescimento foi verificado em 100 miligramas de glitter por litro de água, porém efeitos adversos foram notados em concentrações de purpurina superiores a 137,5 miligramas por litro de água, afetando a densidade celular sem recuperação. Essas diferenças na taxa de crescimento foram notadas apenas no 21º dia do experimento.

Não foram identificadas diferenças significativas entre as concentrações de clorofila e carotenoides totais. Contudo, em valores absolutos, ambas as linhagens demonstraram redução nos níveis de carotenoides nos grupos expostos a 200 e 350 miligramas de glitter por litro de água. Além disso, uma variação na fluorescência da clorofila foi observada em Nodularia spumigena para células expostas a 350 miligramas por litro de água.

Leia Também

CARNAVAL SUSTENTÁVEL

Os pesquisadores acreditam que o estudo ofereça embasamento para que o poder público e a população repensem as comemorações da festa mais popular do país e estimule um consumo mais consciente de itens derivados de plástico.

“O glitter foi criado para ser usado em festividades e, nesses momentos, as pessoas acabam não pensando na problemática criada para o meio ambiente”, acredita Marli de Fátima Fiore, pesquisadora do Cena-USP e coordenadora do trabalho.

“Mas é preciso lembrar que esses microplásticos comprometem e contaminam ecossistemas tanto marinhos quanto de água doce, que são extremamente importantes para nossa vida, e pensar em campanhas para para que eles sejam evitados ao máximo", completa. 

A próxima etapa da pesquisa envolve a realização dos mesmos testes em uma gama mais ampla de linhagens de cianobactérias. Além disso, os pesquisadores planejam analisar o glitter que se declara biodegradável, a fim de determinar se esse material de fato não causa impactos nos organismos. Isso inclui a investigação de possíveis danos decorrentes de pigmentos que contenham metais em sua composição.

*Com informações da Veja 

Tags

Autor