Especialistas explicam como criar e manter uma rotina diária produtiva, saudável e realista

Entenda porque o cérebro "gosta" de rotinas, porque procrastinamos e como é ´possível estabelecer e manter um planejamento diário.

Publicado em 15/05/2025 às 11:27 | Atualizado em 15/05/2025 às 11:31
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Você já tentou desenvolver um novo hábito e deixou de ser constante em poucos dias? Já escreveu aquela lista clássica de resoluções de ano novo e a engavetou em questão de semanas? Já procrastinou uma tarefa simples, que você sabia que não levaria muito tempo, mas simplesmente não encontrou motivação para se mexer? Se sua resposta foi sim para uma dessas perguntas — ou todas —, saiba que você não está sozinho.

Uma pesquisa realizada pela empresa especializada em produtividade Triad Productivity Solutions, que contou com a participação de 4.102 pessoas de 22 estados do Brasil, concluiu que 97,4% dos brasileiros adiam atividades em seu dia a dia. Mas por que isso acontece? Será que é possível vencer uma luta contra a temida, mas tão presente, procrastinação?

Por que procrastinamos?

A procrastinação pode ter uma série de motivos diferentes, que variam de pessoa para pessoa. De maneira geral, fazemos isso porque nosso cérebro tende a desejar atividades que nos forneçam uma recompensa imediata. Rolar a tela em uma rede social com feed infinito ou ver mais um episódio daquela série que estamos assistindo pode parecer mais gratificante do que realizar atividades que exigem esforço e só darão frutos concretos no futuro.

Entendendo a procrastinação de maneira específica, para algumas pessoas, a principal causa pode ser o medo do fracasso. A baixa autoestima, o perfeccionismo e a insegurança fazem com que o temor de não conseguir realizar uma tarefa da melhor maneira possível nos paralise. Assim, não tentar parece melhor do que ter de encarar um resultado não satisfatório.

Com essa percepção, compreende-se que nem sempre a procrastinação é uma questão de preguiça. Há fatores mais complexos que isso por trás desse fenômeno, e é importante que, ao tentar vencê-lo, identifiquemos de onde ele vem.

Como vencer a procrastinação?

Nosso cérebro está em uma constante busca por economia de energias. Conforme explica a psicóloga e professora universitária, Isabelle Spinelli, seguir uma rotina se torna uma ótima forma de combater a procrastinação, uma vez que, quando temos noção das nossas ações futuras, dedicamos menos tempo para processar informações, o que reduz o esforço mental. "Isso gera uma sensação de segurança e previsibilidade, o que diminui o estresse e a ansiedade. Uma rotina estruturada ajuda a manter o foco, melhora a gestão do tempo, promove uma maior sensação de controle sobre o dia a dia e contribui para o alcance de metas e objetivos", afirma.

A psicóloga Carolina Holanda reforça a importância da rotina para a sensação de tranquilidade, já que a incerteza da falta de planejamento diário pode ser interpretada pelo cérebro como uma ameaça geradora de ansiedade e preocupações: "Como nossa mente busca gratificação imediata, ela contrabalança isso com a rotina ao fornecer segurança. É como se construísse algum tipo de ordem no tumulto mental e dos ambientes."

Primeiros passos para o planejamento de uma rotina

Para Carolina, o primeiro passo para criar uma rotina eficiente e realista é entender quais objetivos buscamos conquistar por meio dela. A partir dessa reflexão, é possível levantar o que é preciso fazer: quais são as tarefas, demandas a serem atendidas e novos hábitos a serem criados. "Pensar sobre essas questões são essenciais para evitar o risco de implantar uma rotina baseada em expectativas externas, sejam do seu gestor, algum familiar ou até de algum amigo", diz ela.

A psicóloga, neuropsicóloga e professora de Psicologia do Centro Universitário Tiradentes (Unit-PE), Giedra Marinho, também traz reúne dicas de como estabelecer novos planejamentos diários. Ela ressalta que cada pessoa tem uma forma específica de criar rotinas, mas, em geral, colocar um cronograma escrito na parede, fazer mapas mentais e listas para dar check a cada atividade cumprida ou ter um planner, por exemplo, costumam ser boas opções. "Tem gente que gosta muito de escrever ou fazer um painel no quarto. O visual é muito importante", conta.

Pexels
O aspecto visual é importante na hora de encontrar motivação para seguir uma rotina - Pexels

Mais uma dica é sempre tentar organizar um horário específico do dia, se possível, para produzir, seja em casa ou no ambiente de trabalho. Manter os locais por onde mais circulamos, especialmente o lar, organizados, sem muita poluição visual, é essencial.

Outra tática para ter maior sensação de rotina é frequentemente iniciar esses momentos de foco com uma comida ou bebida de conforto, como um café ou chá. Dessa forma, a mente começa a se acostumar com nossos planejamentos e a produtividade se torna mais e mais notável. Giedra salienta: "a gente tem um tesouro, que é o nosso cérebro, mas não sabemos usar."

Nesses momentos de produtividade, Giedra aconselha organizar o que é prioridade e o que pode esperar um pouco: "comece primeiro com as demandas que são urgentes, que tem meta e prazo definido. Muita gente quer dar conta de tudo, mas se perde por causa de prazos".

Outro ponto importante é entender em quais horários você funciona melhor para cada tipo de atividade antes de colocá-las na agenda, segundo Carolina. "Depois compreender que toda mudança exige tempo para ser internalizada. Não adianta querer começar já atendendo a todas as suas expectativas. É preciso criar consistência e para isso você vai mudando de hábito gradualmente", afirma ela.

Por último, é essencial pensar em um planejamento viável, não ideal. "Muitas vezes, a nossa tendência é “copiar” ou querer fazer da mesma forma de outras pessoas. Só que a rotina precisa fazer sentido para quem vai realiza-la", destaca Carolina.

E quando falta motivação?

Nem todos os dias serão motivos por motivação. E, para Isabelle, tá tudo bem. Ela explica que é essencial construir rotinas baseadas em clareza e propósito, e não apenas na empolgação do momento: "é essa clareza que sustenta a disciplina, especialmente nos dias em que a motivação faltar. Nos momentos mais difíceis, vale retomar o motivo que te levou a começar".

Giedra também dá uma dica para manter o propósito e motivação: "nosso cérebro se acostuma com uma rotina principalmente quando podemos adicionar uma atividade física. Nem todo mundo consegue, mas é ótimo começar o dia com exercícios. Isso levanta os níveis de dopamina e serotonina".

Como identificar quando a rotina está virando um problema?

A rotina pode se transformar em um problema quando está gerando muita ansiedade pelo não cumprimento de demandas ou porque não dá espaço para a criatividade, por exemplo. "As pessoas podem ficar tão engessadas no que está planejado que não consideram as oportunidades de desenvolvimento que surgem a partir dos imprevistos e dos conflitos que são naturais a qualquer realidade", exemplifica Carolina.

"A rotina deve ser um suporte ou direcionamento, não uma prisão ou limitação. Quando você começa a se sentir ansioso, culpado ou frustrado por não conseguir segui-la, ou quando a rigidez está te impedindo de aproveitar a vida e se conectar com o presente, é hora de repensar", sugere Isabelle.

Desafios para pessoas neurodivergentes

Indivíduos neurodivergentes podem enfrentar desafios singulares na criação e manutenção de rotinas, uma vez que seus processos cognitivos e sensoriais funcionam de maneira diferente.

A psicóloga especialista em autismo e fundadora do Instituto Dimitri Andrade, que atende pessoas neurodivergentes da infância à vida adulta, Frínea Andrade, explica algumas técnicas de organização e produtividade que funcionam melhor para pessoas neurodivergentes, mas também podem ser experimentadas por neurotípicos.

  • Visualização: Utilizar agendas visuais, quadros de horários com imagens ou cores, e aplicativos com interfaces visuais claras pode facilitar a compreensão e o seguimento da rotina.
  • Divisão de tarefas: Quebrar tarefas complexas em etapas menores e mais gerenciáveis pode reduzir a sobrecarga e aumentar a sensação de realização.
  • Timers visuais: Ferramentas como o Time Timer podem ajudar a gerenciar o tempo de forma concreta, especialmente para quem tem dificuldade com a percepção temporal.
  • Listas de tarefas priorizadas: Focar em poucas tarefas essenciais por vez, com prioridades claras, pode ser mais eficaz do que listas longas e desorganizadas.
  • Uso da tecnologia: Aplicativos de lembretes, calendários com alarmes, e ferramentas de organização personalizáveis podem ser aliados importantes.
  • Criação de gatilhos ambientais: Associar tarefas a estímulos específicos (por exemplo, preparar o café assim que levantar) pode ajudar a automatizar a rotina.
  • Flexibilidade e adaptação: Reconhecer que a rotina pode precisar ser ajustada em alguns dias e permitir essa flexibilidade pode reduzir a frustração e aumentar a sustentabilidade.
  • Foco nos pontos fortes: Utilizar os interesses especiais e as habilidades de hiperfoco de forma estratégica para realizar tarefas relacionadas ou para criar sistemas de organização personalizados.
  • Minimizar distrações: Criar ambientes de trabalho ou estudo com o mínimo de estímulos sensoriais disruptivos pode melhorar a concentração e a adesão à rotina.
  • Recompensas e reforços: Utilizar reforços positivos após a conclusão de tarefas da rotina pode aumentar a motivação e a probabilidade de repetição.

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